Remei
Revista de Mídias Eletrônicas Informacionais
O que é realmente novo na "nova política"?
Por Pedro Monteiro
A eleição presidencial de 2014 parece que vai se transformar na mais disputada do pós-ditadura. Com a morte do candidato Eduardo Campos em um trágico acidente de avião, a sua vice na chapa, Marina Silva, assumiu o seu lugar e abalou as pesquisas de opinião que mostravam um cenário mais uma vez polarizado entre o PSDB e o PT. A candidata, que na última eleição disputou a presidência pelo PV e conseguiu 20% dos votos válidos, dessa vez passou por uma situação no mínimo inusitada. Marina de início não disputaria a eleição na chapa do PSB e sim pelo partido que tentou criar, o Rede Sustentabilidade. Com a negativa do TSE devido a problemas nos registros de assinaturas para a criação do partido, Marina desistiu de se candidatar a presidente e entrou na chapa do PSB como vice a convite do então cabeça Eduardo Campos.
Charge de Afif Domingues
A candidata Marina começou sua campanha para a presidência persistindo em um termo, “a nova política”. Em todos os debates e em seu horário eleitoral ela disse que, se eleita, iria governar de um jeito diferente, utilizando os “melhores” em cada função. Cientistas políticos e sociais deram a sua opinião para uma comprensão melhor do que seria essa “nova política” - e se ela realmente é possível, visto que um dos ataques mais utilizados contra a campanha da candidata foi exatamente a afirmação de que essa nova política não passa de jogo eleitoral, e que se eleita ela necessariamente precisaria da velha política para poder governar.
Se a opinião da academia for a mais relevante nessa discussão, Marina está apenas criando um novo slogan eleitoral. Para os cientistas políticos Raul Magalhães, Ignacio Delgado e Marcelo Dulci, da UFJF, e para o cientista social Edison Gastaldo, da UFRRJ, a “nova política” não passa de marketing eleitoral da candidata. Todos avaliam que no atual sistema político brasileiro é inviável o tipo de modelo que ela propõe e concordam também que é impossível governar sem fazer alianças políticas com o Congresso Nacional, correndo o risco do Poder Executivo ficar paralisado e de mãos atadas.
Nas palavras de Dulci, “a transição democrática, dos anos 80, trouxe para nosso sistema eleitoral e nosso sistema partidário enorme liberdade de organização e muita fragmentação. Então, para alcançar um mínimo de governabilidade (no país, nos estados e nos municípios), é preciso fazer alianças políticas. São melhores ou piores dependendo do conteúdo e da forma como isso é feito. Exatamente como nos países europeus, por exemplo, embora eles tenham mais experiência em tais coisas, o que não implica em melhores governos. Pode não ser o melhor jeito de governar, mas não existe outro em um contexto de grande fragmentação representativa (uns vinte partidos com representantes eleitos no país)”.
Os analistas políticos acreditam que é necessário algum tipo de reforma política que mude na raiz os problemas vistos por todos nós, como acordos fisiológicos e uma relação espúria entre o público e o privado. Eles concordam que as forças políticas brasileiras ainda não chegaram a um consenso sobre qual seria a melhor reforma. Ignacio Delgado afirma “que é necessária uma reforma política, com financiamento público de campanha, com voto em lista fechada ou sistema distrital misto, para garantir mais densidade à representação, regional e de correntes de opinião, maior racionalidade e estabilidade na composição das maiorias”.
Na avaliação de Marcelo Dulci, as reformas já estão em curso. Ele cita a lei da ficha-limpa como exemplo e acredita que dessa forma, vagarosa e parceladamente, seja melhor e mais prudente. O cientista social Edison Gastaldo vai além e defende também uma lei que regule a imprensa. “É preciso uma reforma política profunda, associada a uma Lei de Mídia. Sem regulamentação, fica essa situação que temos hoje, com jornais, revistas e emissoras que se assumem como porta-vozes da sociedade (delegação que esses veículos não receberam), defendendo agendas que deveriam pertencer a partidos políticos.”
Veja, no infográfico abaixo, como funcionam as diferentes propostas de reforma política.
Vários países do mundo já fizeram suas reformas políticas, alguns tiveram sucesso e outros não. No Brasil essa discussão é inevitável e tende a cada fez ficar maior, ainda que seja difícil a sua implementação de fato. O cientista Ignacio Delgado avalia que “uma reforma política é sempre um processo complexo pois, por suposto, seria feita por quem tem a perder com ela. Por isto, em diversos casos, ocorreu em situações de crise institucional, como na Alemanha, que instituiu o voto distrital misto após a Segunda Guerra. No Brasil, ou se dá por via de uma constituinte exclusiva proposta por grupos de esquerda, o que é pouco provável, ou de forma incremental, passo a passo. O importante é manter o debate aceso e despertar a sociedade para a sua necessidade, para criar um amplo movimento de opinião em seu favor”.
Entre os que não são especialistas no assunto, a opinião é mais dividida. No vídeo a seguir podemos ver que não existe um consenso sobre a efetividade de uma reforma política.
A “nova política” pode até ser que aconteça, mas enquanto o sistema político brasileiro mantiver práticas atrasadas e viciadas, vai ser apenas um slogan eleitoral. É necessária uma grande discussão em torno das propostas de reforma política para que o país avance institucionalmente e pare de depender de negociatas que, no fim, apenas lesam a população. É necessário que o eleitor entenda que os discursos fáceis de “fora corrupção”, nos atuais moldes da legislação, não passam de demagogia. São, como diria o cientista social Edison Gastaldo, “um velho modelo disfarçado de novidade. Como um Chevette com faróis de Xenon.”